Analfabetos do mundo civilizado
TORONTO (CANADA) - SEMPRE se soube que um dos maiores entraves ao desenvolvimento econômico no
Brasil é o gargalo educacional. Novas pesquisas, porém, revelam que o problema
é muito mais grave do que se supunha. Elaborado pelo Instituto Paulo Montenegro
e pela Organização Não-Governamental (ONG) Ação Educativa, o mais recente
estudo sobre o assunto, mostrou que 38% dos estudantes do Ensino Superior no Brasil
simplesmente "não dominam
habilidades básicas de leitura e escrita".
O INDICADOR
de Analfabetismo Funcional, que resulta desse estudo, não mede capacidades
complexas. Ele é obtido a partir de perguntas relacionadas ao cotidiano dos
estudantes, como o cálculo do desconto em uma compra ou o trajeto de um ônibus.
Mesmo assim, 38% dos pesquisados não atingiram o nível considerado "pleno" de alfabetização, isto é,
não conseguem entender o que leem nem fazer associações com as informações que
recebem.
SEGUNDO
os autores da pesquisa os resultados indicam que o notável aumento da
escolarização verificado nas últimas décadas ainda não se traduz em desempenho
minimamente satisfatório em habilidades básicas, como ler e escrever, e isso
num ambiente em que essas etapas do aprendizado já deveriam ter sido plenamente
superadas, isto é, nas universidades particulares.
A
"POPULAÇÃO" do Ensino Superior,
com a abertura indiscriminada de faculdades ávidas por explorar um público de
baixa escolaridade - que não consegue ingresso nas Universidades Públicas e de
prestígio, mas sabe que o diploma de Graduação é uma espécie de "passaporte" para melhorar o salário
-, é vista como um dos fatores principais do fenômeno. Essas escolas, concluem
os especialistas, se adaptaram confortavelmente a um mercado consolidado, e só
reagirão diante da exigência sistemática por melhor qualidade, que deve vir do
governo e dos próprios alunos.
NO
entanto, o tempo para a reversão desse quadro é curto. O sentido de urgência se
dá diante do desafio de colocar o Brasil entre os países mais competitivos do mundo, ante o encolhimento dos mercados
por conta da crise econômica internacional. A situação de semianalfabetismo
nos campi universitários brasileiros - que contraria o discurso populista da
presidente da República Dilma Wana Rousseff (PT-RS), segundo o qual seu governo
(2011-14), como o anterior (2003-10), cuida mais dos jovens do que do Produto
Interno Bruto (PIB) - talvez seja o indicador mais importante para medir o
tamanho do fosso que nos separa do mundo desenvolvido.
EM
primeiro lugar, a indigência intelectual compromete os projetos de
aperfeiçoamento profissional, por mais bem-intencionados que sejam. Não se pode
esperar que egressos de faculdades sem nenhuma qualificação possam acompanhar
as mudanças tecnológicas e científicas cujo desenvolvimento é precisamente o
que determina a diferença entre países ricos e pobres. A China, por exemplo, já
entendeu que sua passagem de "emergente"
para "desenvolvida" não
pode prescindir da qualificação de seus trabalhadores.
O
GOVERNO da China têm investido pesadamente no Ensino Superior de qualidade,
cujas matrículas foram multiplicadas por seis nos últimos dez anos. Agora,
quase 20% dos jovens em idade universitária estão no ensino superior na China,
enquanto no Brasil não passam de 10%. Ademais, o governo chinês demonstra há
décadas um vivo interesse em enviar estudantes ao exterior, para uma preciosa
troca de informações que encurta o caminho daquele país na direção do domínio
técnico essencial ao seu desenvolvimento. Só em 2008 os chineses mandaram 180 mil
estudantes para as melhores Universidades do mundo, volume que se mantém ano a
ano. O Brasil apenas iniciou este ano o Programa Ciência Sem Fronteira, que
pretende enviar 110 mil estudantes nos próximos anos.
O IMPACTO
do investimento chinês em educação aparece no cenário segundo o qual quase
metade do extraordinário crescimento econômico daquele país resulta desse
esforço de qualificação. Assim, se o Brasil tem alguma pretensão de competir
com o gigante chinês, ou mesmo com países emergentes menos pujantes, o primeiro
passo talvez seja admitir que é inaceitável entregar diplomas universitários a
quem seria reconhecido como analfabeto em qualquer lugar do mundo civilizado.
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