Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, outubro 11, 2009

Prenúncio de Estadista

RIO DE JANEIRO - NA MANHÃ da última Sexta-feira, 08, o presidente da República dos Estados Unidos da América (EUA) Barack Houssein Obama, foi despertado pela esposa, Michelle Obama, para receber a notícia com a qual nem mesmo ele ousaria sonhar - pelo menos, não de imediato. Antes de completar nove meses na Casa Branca, ele acabara de ser contemplado com o Prêmio Nobel da Paz "por seus extraordinários esforços para fortalecer a diplomacia internacional e a cooperação entre os povos". A honraria desconcertou o mundo e acrescentou outro marco singular à fascinante saga do primeiro presidente negro dos EUA, em meio aos ferozes ataques de que tem sido alvo em seu país, não raro com tinturas racistas, e, principalmente, quando é demasiado cedo para saber se suas corajosas iniciativas na arena global têm chances de dar certo. Pode-se argumentar, portanto, que o comitê responsável pela escolha dos felizados para conceber a insígna Nobel resolveu premiar as boas intenções de Obama na expectativa, quem sabe ingênua, de contribuir para o êxito das políticas que as expressam.


O JURI do Nobel subscreveu a agenda externa de Barack Obama, a começar da "sua visão e trabalho por um mundo sem armas nucleares", saudou implicitamente o fim do supremacismo norte-americano que marcou a era George W. Bush - "a diplomacia multilateral recuperou uma posição central, com ênfase no papel das Nações Unidas e de outras instituições internacionais" - e o papel "mais construtivo" agora desempenhado pelos EUA diante dos desafios da mudança climática. Mas também ressaltou os atributos e convicções pessoais do presidente dos EUA. "Só muito raramente alguém terá capturado as atenções mundiais como Obama, proporcionando esperanças de um futuro melhor", afirma o comunicado oficial da premiação. "A sua diplomacia se fundamenta no conceito segundo o qual aqueles que se propõem a liderar o mundo devem fazê-lo com base nos valores e atitudes compartilhados pela maioria da população mundial".


MUITO ALÉM das belas palavras, o espanto com que a decisão foi recebida obrigou o presidente do comitê e ex-primeiro-ministro norueguês Thorbjorn Jagland a defender a escolha - um constrangimento incomum na história da láurea. Em 1994, por exemplo, quando o Nobel da Paz foi entregue para o primeiro-ministro israelense, Yitzhak Rabin, e o presidente da Autoridade Palestina, Yasser Arafat, as razões eram óbvias e incontestáveis. Desta vez, Jagland precisou esclarecer que o prêmio não foi concedido "pelo que possa acontecer no futuro". Para ele, "a pergunta que temos de fazer é quem fez mais durante o ano para promover a paz no mundo". De fato, ou se adota esse critério, ao risco de a decisão ser tachada de prematura, ou se espera o tempo dizer que o que foi feito tornou o planeta mais pacífico. No primeiro caso, o prêmio é um incentivo político - com a vantagem, no caso, de associar o Nobel à imagem do político mais carismático do mundo. No segundo, é o reconhecimento de fatos consumados.


NESTE momento da nossa História, Barack Obama é um semeador, condição necessária para um chefe de Estado chegar a estadista. É preciso reconhecer a diversidade das iniciativas de Obama e a intensidade com que as anunciou e passou a defendê-las, criando o "novo clima" na arena internacional, aplaudido pelo comitê do Nobel. Ele colocou na ordem do dia a questão do desarmamento nuclear - para muitos, uma utopia; para outros, um movimento para legitimar o combate à proliferação de armas atômicas. Nessa frente, ora oferecendo a mão estendida, se o interlocutor abrir o punho, ora ameaçando com sanções mais duras no âmbito da Oraganização das Nações Unidas (ONU), Barack Obama conseguiu levar o Irã a discutir o seu programa nuclear com um sexteto de países, entre os quais os EUA. Foi "um começo construtivo", avaliou. Nem isso lograram as suas tentativas de reavivar o processo de paz entre israelenses e palestinos - e até onde a vista alcança não se sabe quando, ou se, os sucessores de Rabin e Arafat honrarão o Nobel que eles receberam.


BARACK Houssein Obama já fez história com o seu discurso na Universidade do Cairo, ao propor ao mundo islâmico uma relação fundada no respeito mútuo. Mas o Islã não se aliou aos EUA na guerra cada vez mais difícil (e cada vez mais impopular nos EUA) contra os fundamentalistas do taleban no Afeganistão. O que já vem sendo chamado "a guerra de Obama" tem relutante apoio mesmo entre os governos dos países da União Europeia (UE) onde leva multidões às ruas. Talvez, infelizmente, o prêmio Nobel não mudará essa realidade.


MAS de qualquer forma foi um gol de placa, pela importância histórica e da dimensão da honraria neste momento de fragilidade pelo qual a nação norte-americana está atravessando.


MUITTTOOOO mais do que qualquer Copa do Mundo e/ou Olimpíadas (que certamente, com a qualidade daqueles que estão a frente dos preparativos, nos trará mais decepções do que alegrias), a honraria do Nobel a Barack Houssein Obama já é parte da História. Bravo!