Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quinta-feira, junho 30, 2011

O risco grego

O GOVERNO grego mantém o mundo em suspense enquanto, enfrentando protestos de rua e forte oposição política, tenta obter a aprovação de novas medidas de aperto fiscal, em mais um esforço para evitar o calote. A aprovação do plano no Parlamento poderá desobstruir a liberação de mais uma fatia de 12 bilhões do pacote de auxílio de 110 bilhões montado há pouco mais de um ano pela União Europeia (UE) e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Sem esse dinheiro o Tesouro Nacional grego será incapaz de pagar as dívidas com vencimento neste próximo Julho. O primeiro passo para a adoção das novas medidas foi dado no dia 21 último, quando o primeiro-ministro, George Papandreou, obteve do Parlamento um voto de confiança. Foram 155 votos favoráveis, 143 contrários e 2 abstenções. No último dia 23 foram acertados com o FMI e a UE os detalhes do plano. Faltaria ao governo conseguir o apoio político para iniciar a nova fase do ajuste.

CASO o esforço der certo, mais uma parcela da ajuda será liberada em julho. Além disso, novo empréstimo, estimado em 120 bilhões, está em discussão. O governo grego tem ao mesmo tempo negociado com a chamada troica - FMI, UE e Banco Central Europeu (BCE) - e enfrentado a resistência da oposição e dos grupos mobilizados contra os cortes do gasto e o aumento de impostos.

PARA tornar o remédio menos amargo, o governo grego se dispôs a abandonar certas medidas mais dolorosas, como o aumento da carga tributária lançado sobre trabalhadores de baixa renda. A mudança desagradou aos técnicos da troica. Mas o acordo alcançado no último dia 23 inclui maiores impostos e maior contenção de despesas. O ajuste deve ser suficiente para uma economia de 6,4 bilhões neste ano. Além disso, está previsto um avanço nas desestatizações da economia.

O QUADRO seria muito mais simples, neste momento, se o grande problema fosse a liquidação das contas com vencimento nos próximos meses, mas a situação é muito mais grave. Mesmo com um grande aperto fiscal e com todo o sacrifício imposto à população - o desemprego passou de 11,6%, em Março do ano passado, para 16,2%, neste ano -, será muito difícil o governo grego pagar as dívidas sem uma reestruturação. Algum tipo de calote ainda é altamente provável.

ESSA opinião é obviamente partilhada pelo governo da maior economia europeia, a Alemanha, embora nenhuma autoridade europeia admita abertamente o risco. A primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, tem liderado um esforço político para envolver os bancos no socorro à Grécia. A participação seria voluntária. Os banqueiros aceitariam rolar a dívida e facilitar seu pagamento, talvez incorrendo em alguma perda. Nesse caso, talvez o acerto seja visto, tecnicamente, como algo diferente de um calote. O detalhe é importante, porque os próprios bancos são sujeitos à avaliação de risco.
UM calote atabalhoado, argumentam os defensores de uma reestruturação "voluntária", seria desastroso para o sistema financeiro e para os demais países com dívida pública elevada. Portugal e Irlanda, já envolvidos em programas financiados pela UE e pelo FMI, poderiam enfrentar novos problemas.

NEM mesmo a maior potência econômica (os Estados Unidos da América – EUA) ficaria ilesa, no caso de um calote grego. Quem o afirma é Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano). "O impacto nos EUA", segundo ele, "seria significativo." O choque seria indireto, porque os bancos norte-americanos têm negócios importantes com bancos europeus diretamente expostos ao risco da dívida grega. Mas poderia, segundo Bernanke, tornar ainda mais lenta a recuperação do país.

O FMI e o BCE têm rejeitado toda insinuação a respeito de uma reestruturação da dívida grega. O BCE tem um motivo especialmente forte, porque detém uma carteira de títulos de alto risco, acumulados durante operações de ajuda a governos. Um calote afetaria o valor desses papéis.

A DÍVIDA pública da Grécia está estimada em 157,1% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano e deve subir para 159,3% em 2012, segundo instituições multilaterais. Mas todos os governos do mundo rico estão superendividados. A média estimada para os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 102% em 2011 e de 105% em 2012. Todos têm motivo para seguir com muito nervosismo a evolução do drama grego.