Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, abril 06, 2011

Crimes confirmados

O DEPARTAMENTO de Polícia Federal (PF) levou nada menos de 6 anos para confirmar que o esquema quadrilheiro petista de pagamentos ilícitos a políticos conhecido como Mensalão empreendido pelo delubiovalerioduto, sob o comando do então comissário e hoje ex-deputado federal cassado, José Dirceu (PT-SP), e trazido à tona em 2005 pela Imprensa, não é a "farsa" de que fala cinicamente o ex-presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), mas um fato objetivo, documentado e que não comporta mais de uma interpretação. Assim não fosse, o Supremo Tribunal Federal (STF) não teria aceito praticamente na íntegra a denúncia do então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, contra os 40 membros da "organização criminosa" liderada pelo, então, ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, Zé Dirceu, e autora do maior escândalo de corrupção já identificado neste grande e bobo País.

DEZENAS de parlamentares representantes de cinco partidos receberam no mínimo um total de R$ 55 milhões, ou para votar com o governo ou, no caso de deputados federais filiados ao Partido dos Trabalhadores (PT), para abastecer seus cofres eleitorais. Neste último fim de semana, faltando menos de meio ano para prescrever talvez o principal delito de que são acusados os mensaleiros - o de formação de quadrilha, mencionado mais de 50 vezes na peça incriminatória acolhida pelo STF -, a reportagem da Revista ÉPOCA (EDITORA GLOBO) em sua edição de Segunda-feira, 04, revelou ter tido acesso às 332 páginas que formam o relatório final do DPF, do qual transcreveu trechos contundentes. A investigação não deixa em pé nenhuma dúvida sobre a origem do dinheiro usado para comprar políticos venais e reforçar as finanças da companheirada do lullopetismo.

NA esmagadora maioria dos casos, foram os contribuintes brasileiros que pagaram indiretamente a lambança, mediante recursos transferidos da área pública para as empresas do lobista mineiro Marcos Valério Fernandes de Souza, o operador do Mensalão recompensado com opulentos contratos com setores da administração federal. O Fundo Visanet, do qual participa o Banco do Brasil S/A (BB), repassou R$ 68 milhões a Marcos Valério. As datas dos recebimentos tendiam a coincidir com as dos pagamentos que fazia aos políticos mensaleiros. O dinheiro saía das contas do lobista mineiro no BB e passava pelo Banco Rural S/A antes de chegar aos beneficiários. Não havia portas no governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) que não se abrissem para Marcos Valério, concluiu a investigação do DPF.

A APURAÇÃO, requerida pelo ministro Joaquim Barbosa, relator do processo no STF, acrescenta aos acusados de envolvimento com o Mensalão nomes como os do atual ministro de Estado do Desenvolvimento da Industria e Comércio Exterior, o ex-prefeito municipal de Belo Horizonte (MG), Fernando da Mata Pimentel (PT-MG), e do líder do governo Dilma Rousseff (2011-14) no Congresso Nacional, o senador da República Romero Jucá (PMDB-RN). Mas, principalmente, trouxe Luiz Inácio da Silva para a “sala” do escândalo. Em Agosto de 2006, uma reportagem do Jornal O ESTADO DE S. PAULO (O ESTADÃO) já havia revelado que Freud Godoy, segurança do então candidato presidencial, Luiz Inácio da Silva, em 1998 e em 2002, recebeu R$ 98,5 mil do delubiovalerioduto. Agora se sabe que Godoy disse aos policiais federais que o dinheiro obtido de Marcos Valério se destinava a cobrir parte dos R$ 115 mil da conta que apresentara ao PT pelos serviços prestados na campanha lullista. Foi o PT que o encaminhou à agência de publicidade de Valério.

CLARO que Luiz Inácio da Silva poderá alegar que não teve nada com isso, assoberbado que estaria com questões mais importantes do que o custo e a forma de pagamento do seu segurança (e amigo há 20 anos). Poderá também repetir, como disse quando rebentou o escândalo do Mensalão, que "foi traído" - naturalmente, sem apontar os presumíveis traidores. Penitente, poderá mais uma vez afirmar que "devia desculpas" ao País. Mas a volta do Mensalão ao noticiário, a partir de um documento do DPF que não apenas corrobora o que já era de conhecimento público, porém adiciona novos nomes e fatos, como a conexão Lula-Godoy-PT-Valério, é um golpe para a pretensão do ex-presidente da República de sair por aí desmoralizando a denúncia que marcou para sempre o seu governo.

O ALVO do ex-presidente da República é o STF. Contando com a erosão da memória nacional, ele decerto há de ter calculado que a passagem do tempo e a pressão implícita na sua anunciada campanha acabariam pesando na decisão da Corte Suprema sobre o destino dos 38 réus remanescentes no processo. A sentença judicial está prevista para 2012. Paradoxalmente, dependendo do que a Justiça fizer com o tardio relatório do DPF, os acusados poderão ensaiar novas manobras para protelar o que, pelas evidências recolhidas, só poderia conduzir a uma condenação exemplar.