Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, agosto 17, 2010

Equipamento perturbador e ineficaz

COM a manutenção do prazo para que as empresas passem a fornecer comprovantes dos horários de entrada e de saída de seus empregados, o ministro de Estado do Trabalho e do Emprego, Carlos Lupi (PDT-SP), só não ficou completamente isolado porque deve contar com o decidido apoio daqueles que parecem os grandes interessados no assunto: os fabricantes dos equipamentos de registro de ponto que, a partir do próximo dia 21, as empresas passarão a utilizar, substituindo os que têm utilizado até agora. A medida vem sendo criticada há tempos por dirigentes empresariais e lideranças sindicais, que a consideram desnecessária e contraproducente para a melhoria das relações entre patrões e empregados.

HÁ quase um ano, em 21 de Agosto de 2009, o ministro Lupi assinou uma Portaria para disciplinar o ponto eletrônico e a utilização do Sistema de Registro Eletrônico de Ponto (SREP), com o alegado objetivo de dar maior certeza na aferição do registro da jornada de trabalho nas empresas com mais de dez empregados e assim combater as fraudes no pagamento das horas extras. A Portaria fixou prazo de um ano para as empresas que utilizam o registro eletrônico de ponto se adaptarem às novas regras.

AS novas máquinas só podem ser fabricadas por empresas certificadas pelo Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE) seu preço unitário varia de R$ 2,5 mil a R$ 6 mil. Estima-se que pelo menos 500 mil empresas terão de seguir a Portaria, regulamentada por uma Instrução Normativa publicada no Diário Oficial da União (DOU) no último mês de Julho. É um custo adicional para a atividade produtiva no País, que já enfrenta outros grandes obstáculos para aumentar sua eficiência e competitividade.

PORTANTO, trata-se de um gasto elevado e desnecessário para as empresas. Quanto à defesa dos interesses dos trabalhadores - que, alegadamente, é a razão da mudança -, a eficácia da medida é discutível. Dirigentes da Central Única dos Trabalhadores (CUT) observam que, se a intenção é combater a burla ao pagamento com adicionais das horas extras trabalhadas, o relógio de ponto eletrônico não funciona, pois o empregado, por ordem da empresa, bate o ponto de saída e retorna ao posto de trabalho para cumprir a jornada extraordinária.

INEFICAZ para combater a burla, o ponto eletrônico com emissão de comprovante pode tornar-se um elemento perturbador nas relações de trabalho em empresas nas quais, pela maturidade de sua administração e dos dirigentes sindicais, vigoram acordos coletivos que estabelecem direitos e obrigações claras para as duas partes. No ABCD paulista, por exemplo, alega o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Sérgio Nobre (PT-SP), as relações trabalhistas estão mais evoluídas e a Portaria é um ato de desprestígio para as categorias organizadas e para os acordos coletivos. "Esse é um remédio para quem está doente", argumenta Nobre. Ou seja, a medida pode funcionar em empresas que tenham problemas, mas é desnecessária para as demais.

Além de desnecessária, é altamente prejudicial para os trabalhadores e para as empresas. "Se for necessário esperar sair o registro do ponto em forma impressa, como está previsto, isso geraria uma grande fila, uma grande acumulação de trabalhadores aguardando a emissão do comprovante", lembrou o secretário-geral da CUT, Quintino Severo (PT-SP). "Imagine as filas enormes que vão se formar em uma Volkswagen, em que 10 mil pessoas entram no mesmo horário e hoje têm acesso por qualquer uma das entradas apenas passando o cartão nas catracas", exemplificou o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABCD Paulista.

ADEMAIS, imagina-se a quantidade de papéis que cada trabalhador precisará guardar como comprovante de sua jornada de trabalho. Por dia, são no mínimo 4 comprovantes (entrada, saída para almoço, retorno do almoço, saída), se não fizer horas extras. Considerando-se a média de 23 dias úteis, serão 92 por mês. Por ano, quase mil. Serão gastos adicionais com papel, quando se procura reduzir seu uso, por razões ambientais.

TRATA-SE de uma medida burocrática, ineficiente, cara, incômoda para os trabalhadores - pois retardará desnecessariamente sua entrada e sua saída -, mas que parece encantar o ministro Lupi. Por quê?