Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quinta-feira, outubro 15, 2009

O desrespeito às Instituições

RIO DE JANEIRO - ESSA aversão do governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) - e do vosso presidente da República a frente - ao controle institucional dos dispêndios públicos em obras de infraestrutura vinha se traduzindo, sobretudo, nas reiteradas investidas contra o Tribunal de Contas da União (TCU), acusado de recomendar ao Congresso Nacional a interrupção de empreendimentos de grande porte e reconhecida urgência por o que seriam, afinal, questões de somenos, pecadilhos formais que poderiam ser corrigidos enquanto os trabalhos (e os desembolsos) prosseguissem. No início deste Outubro, por exemplo, depois que o TCU recomendou a paralisação de 41 obras, das quais 13 incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mediante o bloqueio das respectivas verbas, o ministro de Estado do Planejamento Orçamento e Gestão, Paulo Bernardo (PT-SC), encabeçou um coro de ásperas críticas à atuação do colegiado, como se este tivesse uma perversa propensão a travar o progresso nacional ou estivesse a serviço da Oposição.

EVIDENTEMENTE, Não se trata, nem de uma coisa nem de outra. Para se ter ideia do que se trata, na realidade, a auditoria deste ano em 219 obras da administração federal direta e indireta revelou irregularidades em nada menos de 184. Mas, em vez de admitir que os problemas existem, se concentrar em saneá-los e prevenir a sua repetição em novos empreendimentos, por respeito elementar às leis e ao contribuinte que os sustenta, “O-CARA” resolveu lançar uma operação de grande porte visando ao desmanche do sistema de fiscalização que o perturba incomparavelmente mais do que os malfeitos apurados. Conforme noticiou a reportagem do Jornal O Estado de S. Paulo em sua edição de 08 de Outubro, o governo do petilullismo decidiu mobilizar empresários, sindicalistas, governadores, prefeitos, parlamentares e membros do Ministério Público (MP) - além de procurar os ministros do TCU - para "flexibilizar" os critérios de aferição de licitações e contratos, bem como para a concessão do licenciamento ambiental, das obras da camada do pré-sal, da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro, os três grandes eixos do ciclo de investimentos dos próximos anos.

AOS BONS entendedores, o termo flexibilizar é mais do que bastante. Deixa claro o intento do vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), de subordinar aos seus interesses as normas gerais que se aplicam aos empreendimentos do Estado executados pela iniciativa privada, fragmentando-as de acordo com a destinação das obras - as quais ficariam praticamente a salvo de paralisações. Ninguém ignora que “O-CARA” está obcecado em remover seja lá o que possa atrapalhar a sua ambição de desfilar na campanha eleitoral do próximo ano como o mais realizador dos mandatários brasileiros, para fazer da senhora Dilma Pinóquio Rousseff a sua sucessora. Nos planos do governo, o esquema de "regras próprias" para cada um dos três setores citados - antecipado pelo novo ministro de Estado Extraordinário das Relações Institucionais da Presidência da República, Alexandre Padilha (PMDB-SP) - condicionaria a atuação do TCU e do MP. Os parâmetros de controle válidos em uma circunstância poderão não se aplicar a outra. Seria, em última análise, um indecente casuísmo.

TAL operação deverá ser desencadeada na próxima reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), quando os seus integrantes serão instados a apresentar sugestões para assegurar a continuidade das obras. Numa segunda frente, o governo quer apressar a regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal, que trata da competência dos três níveis de governo na proteção ao meio ambiente. "Hoje", diz Padilha, "muitas obras são paralisadas porque o Ministério Público exige a participação do Instituto Brasileiro de Proteção do Meio Ambiente (Ibama) em algo que deveria ser decidido pelo município ou pelo Estado." Outro alvo do petilullismo é a Lei de Licitações. "Não conheço nenhum brasileiro que não queira mudá-la", disse “O-CARA” numa reunião com empresários, meses atrás. Pode ser. Mas o que ele quer são mudanças para facilitar as compras de bens ou a contratação de serviços pelo setor estatal - não para dar mais lisura aos negócios.

O GOVERNO procura fazer crer que as leis que regulam os seus negócios são impossíveis de ser cumpridas e estão na contramão do progresso. A alegação não se sustenta. O problema está na desídia dos agentes públicos e da sem-cerimônia com o dinheiro alheio, enquanto a busca da eficiência é pretexto para se livrar de controles. A neutralização do TCU nos empreendimentos do pré-sal, Copa do Mundo de Futebol e Olimpíadas do Rio de Janeiro se encaixa rigorosamente nessa jogada.