Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quinta-feira, outubro 22, 2009

Crônica de um fracasso anunciado

UM Mísero ano de vigência foi o que bastou para que a apelidada Lei do Estágio, concebida pelo ministro de Estado do Trabalho e do Emprego (MTE), Carlos Lupi (PDT-SP), com o objetivo de garantir os "direitos" dos estagiários, trouxesse resultados diametralmente opostos aos esperados, como previram os críticos do projeto. Desde que ela entrou em vigor, o número de vagas para estagiários caiu 20%, segundo levantamento da Associação Brasileira de Estágios (ABE). A lei aumentou os encargos sociais para os contratantes de estagiários. E a queda foi causada pela resistência das empresas a se adaptar às novas regras num período de diminuição da atividade econômica provocada pela crise, quando suas vendas se retraíram e seus custos se elevaram.

EM SETEMBRO de 2008, quando irrompeu a crise, havia 1,1 milhão de vagas de estágio distribuídas em 715 mil postos para acadêmicos do Ensino Superior e 385 mil para os alunos do Ensino Médio e Técnico. Agora, em Setembro de 2009, havia 900 mil vagas, sendo 650 mil para estudantes da Graduação e 250 mil para estudantes do Ensino Médio e Técnico.

O ESTÁGIO sempre foi considerado atividade curricular obrigatória pelas Escolas e Universidades. É uma oportunidade para os estudantes de aprofundar, com a prática, os conhecimentos teóricos aprendidos em sala de aula e de conhecer melhor o ambiente físico e humano em que exercerão as profissões que escolheram. Por isso, o estágio não é um emprego, mas uma forma complementar de aprendizado que, até a entrada em vigor da lei concebida pelo ministro de Estado do Trabalho e do Emprego, estava disciplinada por legislação editada em 1997.

SEGUNDO interpretação corrente daquela legislação, o estágio durava de quatro meses a um ano. Como não havia qualquer vínculo empregatício com a empresa contratante, o estagiário recebia uma remuneração pelo trabalho, a título de incentivo, além de vale-transporte e tíquetes de alimentação. Mas não tinha direito a férias, 13º salário e participação nos lucros. A legislação anterior também não estipulava carga horária para o trabalho, limitando-se a recomendar que ele não deveria atrapalhar o horário das aulas.

ENTÃO, sob a alegação de que essas regras levavam os estudantes a serem utilizados como mão de obra barata, o ministro Lupi elaborou uma nova lei que, entre outras medidas, limita o número de estagiários que podem ser contratados. Empresas com mais de 25 funcionários, por exemplo, só podem ter cinco vagas para estágio. Além disso, a lei concede direito de férias, determina que a jornada não pode ultrapassar 30 horas semanais para os estudantes do nível Técnico e da Graduação e 20 horas semanais para os alunos do Ensino Médio e exige que a empresa tenha, para cada estagiário, seguro de acidentes pessoais e responsabilidade civil por danos causados a terceiros. A lei também obriga as empresas a apresentarem relatórios provando que o aluno faz estágio em sua área de estudo, o que elevou em 8,5% os custos com manutenção dos estágios.

ENQUANTO nos últimos anos os países desenvolvidos flexibilizaram a legislação para desonerar as contratações e demissões e dar às empresas condições de adequar seu quadro de pessoal às oscilações de mercado, graças às iniciativas demagógicas do titular do MTE o Brasil caminhou em direção oposta. Para defender os estagiários, o Governo acabou elevando os ônus diretos e indiretos da contratação. E as empresas reduziram o número de vagas para estagiários.

ESSE problema já havia sido apontado pelos especialistas durante a tramitação do Projeto de Lei de Lupi no Legislativo, em 2007, quando havia 1 milhão de estagiários trabalhando na iniciativa privada. Pelas estimativas do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), a proposta do ministro poderia levar à dispensa de até 400 mil estagiários. Ao comentar o projeto aqui neste nosso mesmíssimo espaço diário da globosfera, afirmamos, naquela época, que era uma iniciativa contra os estagiários, e não a favor deles. É fato, como diz Lupi, que algumas empresas sempre usaram estagiários como mão de obra barata. Mas, para resolver o problema, como enfatizamos, bastava aumentar o rigor na fiscalização para evitar os falsos estágios. Ao optar pela demagogia, Lupi acabou prejudicando quem precisa de estágios para se aperfeiçoar.