O insight de Obama
NA ANTEVÉSPERA de completar oito meses na Casa Branca, o presidente da República dos Estados Unidos da América (EUA), Barack Houssein Obama, apresentou semana passada a sua primeira iniciativa concreta de repercussão global no âmbito das relações exteriores dos EUA. Com um movimento efetivo no tabuleiro da grande política internacional, ele finalmente foi além da sua notória perícia no manejo das palavras - como ao estender a mão ao Irã, já no discurso de posse, e ao defender uma nova atitude política e cultural norte-americana diante do mundo islâmico, na memorável alocução de 04 de Junho na Universidade do Cairo.
DESTA VEZ, os fatos falaram, inaugurando um novo padrão de relacionamento dos EUA com a Rússia e o Leste Europeu. Obama removeu um dos mais tóxicos detritos da falida estratégia do governo de George W. Bush (2001-08) para aquela parte do mundo: o plano de instalar na Polônia e na República Checa um escudo antimísseis de longo alcance, que poderiam vir a ser lançados do Irã ou da Coreia do Norte contra os EUA e seus aliados europeus.
DESDE a primeira hora, o governo russo reagiu ao projeto, anunciado em Janeiro de 2007, como uma ameaça e uma provocação. Do ponto de vista militar, o esquema puramente defensivo, constituído por uma base de radar em território polonês e uma bateria de 10 foguetes interceptadores em solo checo, não representaria uma ameaça à segurança russa. Já a provocação era gritante: a pretexto de se precaver contra um risco que o governo da Rússia considerava imaginário - e que agora Obama remete para o futuro -, a decisão norte-americana embutia a pretensão da política externa neoconservadora dos anos W. Bush de fincar uma presença armada, humilhante para os russos, em dois países que lhe são refratários (um, invadido pela então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas em Setembro de 1939; outro, em Agosto de 1968), ambos na "esfera de influência" da Rússia. E este é historicamente o conceito central da sua doutrina militar e o princípio estratégico de suas relações com os vizinhos na imensa área entre o Rio Vístula, na Polônia, e o Mar Negro, no Cáucaso.
GEORGE W. Bush deixou para Barack Obama a herança da crispação - em níveis próximos aos da guerra fria - do diálogo russo-americano. Diante de um líder autocrático, exacerbadamente nacionalista e decidido a restaurar a grandeza russa, como o então presidente da República e atual primeiro-ministro Vladimir Putin (e para irritação dos governos da França e Alemanha), W. Bush defendeu o ingresso da Geórgia e da Ucrânia na OTAN, a Aliança Atlântica de que, por sinal, Polônia e República Checa já são membros. No verão europeu do ano passado, o Exército da Rússia invadiu a Geórgia depois que, desavisada pelos EUA, tentara anexar as províncias separatistas pró-russas da Ossétia do Sul e da Abkházia. Com a troca de ocupantes da Casa Branca, a nova secretária de Estado, Hillary Clinton, foi orientada a oferecer ao colega russo Serguei Lavrov que apertassem a tecla restart para recompor as relações bilaterais.
A INICIATIVA prosperou com a alegada descoberta da espionagem norte-americana de que o programa iraniano de produção de mísseis intercontinentais estava menos adiantado do que o dos projéteis para curtas e médias distâncias, capazes de atingir, por exemplo, Israel. Já não faria sentido, portanto, insistir no escudo abominado pelos russos, a ser substituído por um sistema de prevenção mais eficaz, flexível e avançado. Numa primeira etapa, essa nova "arquitetura de defesa" se baseará na instalação de sensores e mísseis menores de interceptação, a bordo de navios fundeados no Mediterrâneo. Mais adiante, entre 2011 e 2015, o sistema terá uma base em terra, talvez na Turquia. A partir de então, contará com interceptadores efetivos contra mísseis de longo alcance. O caráter defensivo do sistema permanecerá intacto. Obama espera dos russos a contrapartida do apoio na Organização das Nações Unidas (ONU) à aprovação de sanções adicionais ao Irã.
COMO se poderia prever, a primeira resposta do governo russo foi niet, o que deixou o presidente norte-americano desde logo exposto às acusações republicanas de que capitulou diante do Kremlin, abandonando dois sólidos aliados norte-americanos no Leste Europeu. Ouviram-se críticas também em Praga e Varsóvia. Obama precisou invocar a Carta da OTAN, segundo a qual um ataque a um país-membro é um ataque a toda a aliança. Talvez seja pouco para os europeus orientais acreditarem que não terão de pagar o preço do restart russo-americano.
DESTA VEZ, os fatos falaram, inaugurando um novo padrão de relacionamento dos EUA com a Rússia e o Leste Europeu. Obama removeu um dos mais tóxicos detritos da falida estratégia do governo de George W. Bush (2001-08) para aquela parte do mundo: o plano de instalar na Polônia e na República Checa um escudo antimísseis de longo alcance, que poderiam vir a ser lançados do Irã ou da Coreia do Norte contra os EUA e seus aliados europeus.
DESDE a primeira hora, o governo russo reagiu ao projeto, anunciado em Janeiro de 2007, como uma ameaça e uma provocação. Do ponto de vista militar, o esquema puramente defensivo, constituído por uma base de radar em território polonês e uma bateria de 10 foguetes interceptadores em solo checo, não representaria uma ameaça à segurança russa. Já a provocação era gritante: a pretexto de se precaver contra um risco que o governo da Rússia considerava imaginário - e que agora Obama remete para o futuro -, a decisão norte-americana embutia a pretensão da política externa neoconservadora dos anos W. Bush de fincar uma presença armada, humilhante para os russos, em dois países que lhe são refratários (um, invadido pela então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas em Setembro de 1939; outro, em Agosto de 1968), ambos na "esfera de influência" da Rússia. E este é historicamente o conceito central da sua doutrina militar e o princípio estratégico de suas relações com os vizinhos na imensa área entre o Rio Vístula, na Polônia, e o Mar Negro, no Cáucaso.
GEORGE W. Bush deixou para Barack Obama a herança da crispação - em níveis próximos aos da guerra fria - do diálogo russo-americano. Diante de um líder autocrático, exacerbadamente nacionalista e decidido a restaurar a grandeza russa, como o então presidente da República e atual primeiro-ministro Vladimir Putin (e para irritação dos governos da França e Alemanha), W. Bush defendeu o ingresso da Geórgia e da Ucrânia na OTAN, a Aliança Atlântica de que, por sinal, Polônia e República Checa já são membros. No verão europeu do ano passado, o Exército da Rússia invadiu a Geórgia depois que, desavisada pelos EUA, tentara anexar as províncias separatistas pró-russas da Ossétia do Sul e da Abkházia. Com a troca de ocupantes da Casa Branca, a nova secretária de Estado, Hillary Clinton, foi orientada a oferecer ao colega russo Serguei Lavrov que apertassem a tecla restart para recompor as relações bilaterais.
A INICIATIVA prosperou com a alegada descoberta da espionagem norte-americana de que o programa iraniano de produção de mísseis intercontinentais estava menos adiantado do que o dos projéteis para curtas e médias distâncias, capazes de atingir, por exemplo, Israel. Já não faria sentido, portanto, insistir no escudo abominado pelos russos, a ser substituído por um sistema de prevenção mais eficaz, flexível e avançado. Numa primeira etapa, essa nova "arquitetura de defesa" se baseará na instalação de sensores e mísseis menores de interceptação, a bordo de navios fundeados no Mediterrâneo. Mais adiante, entre 2011 e 2015, o sistema terá uma base em terra, talvez na Turquia. A partir de então, contará com interceptadores efetivos contra mísseis de longo alcance. O caráter defensivo do sistema permanecerá intacto. Obama espera dos russos a contrapartida do apoio na Organização das Nações Unidas (ONU) à aprovação de sanções adicionais ao Irã.
COMO se poderia prever, a primeira resposta do governo russo foi niet, o que deixou o presidente norte-americano desde logo exposto às acusações republicanas de que capitulou diante do Kremlin, abandonando dois sólidos aliados norte-americanos no Leste Europeu. Ouviram-se críticas também em Praga e Varsóvia. Obama precisou invocar a Carta da OTAN, segundo a qual um ataque a um país-membro é um ataque a toda a aliança. Talvez seja pouco para os europeus orientais acreditarem que não terão de pagar o preço do restart russo-americano.
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