A metamorfose de um amalucado operário
O INFLUENTE jornal madrilenho El País publicou, no último Domingo das Mães, 09, uma das mais reveladoras entrevistas com o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), em tempos recentes, da mentalidade do popularesco líder político brasileiro. Trata-se de algo próximo a uma proeza, dados os depoimentos literalmente inumeráveis (e cambiantes) que ele já deu sobre si mesmo, e a sua inesgotável capacidade de entrelaçar, em cada pronunciamento, ou às vezes sentença a sentença, raciocínios que desafiam a compreensão - a chamada "quase-lógica", na já clássica formulação da cientista política Luciana Fernandes Veiga -, com manifestações de evidente sensatez.
AMOSTRA dessa última faceta, na sua mais recente entrevista, é a sua visão do que deverá necessariamente nortear as decisões do seu sucessor em relação ao que mais interessa ao Brasil - os fundamentos da política econômica. "Ganhe quem ganhar, ninguém fará nenhum disparate", previu (ou exortou), com o cuidado de acrescentar que está seguro da vitória de sua dileta candidata, Dilma (Pinóquio) Rousseff (PT-RS). E, para explicar a sua profecia, condicionou a elevação do País na hierarquia global ao bom senso do futuro governante. "Se o Brasil mantiver nos próximos 5 anos (a rigor, deveria ter dito 4 anos) a seriedade nas políticas fiscal e monetária, nos investimentos e no controle da inflação", prognosticou, "tem tudo para se transformar numa potência respeitada no mundo”.
E NESSE pedaço, “O-CARA!”pode não fazer a coisa certa - a julgar pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), faltou "seriedade", por exemplo, na política de investimentos, como está faltando agora na política fiscal -, mas, para sorte do interesse nacional, ele aprendeu qual é a coisa certa. Em outras frentes, o caso é mais complicado, e “O-CARA!” frequentemente se entrega a exercícios de contorcionismo verbal ou se agarra ao salva-vidas das metáforas para se explicar. A boia mais robusta a que se abraçou talvez seja a "metamorfose ambulante" que tomou emprestada do finado “Maluco Beleza” Raul Seixas para dissolver as aparentes contradições de sua trajetória.
APARENTES, decerto, porque por baixo das barbas do carbonário de outrora, que proclamava que "hoje não tô bom" e era preciso "mudar tudo isso que está aí", sempre bateu um coração conciliador.
TODAS as contas que não fecham nas declarações do presidente lembram a proverbial quadratura do círculo, ao traduzir um constante esforço de racionalização das escolhas feitas pelo ex-operário que repetiu à reportagem do Jornal El País a confissão de que, em 27 anos, nunca se sentiu à vontade de macacão, mas lhe bastaram 2 meses para se acostumar ao que chamou "bonita prenda", a gravata. Com essa evocação, inadvertidamente “O-CARA!” produziu um dos mais sucintos e límpidos retratos de que se tem notícia da aspiração do povo brasileiro a uma vida melhor, no marco das oportunidades abertas pela economia de mercado, alheio à pregação socialista do Partido dos Trabalhadores (PT) dos tempos carrancudos. Também pudera: ninguém mais do que o próprio Luiz Inácio da Silva encarna o vigor da mobilidade social brasileira.
A PROPÓSITO, a última dele na mesma entrevista e na mesma clave autojustificadora, foi dizer que o advento do socialismo no País passa pela consolidação do capitalismo. "Primeiro construir o capitalismo, depois fazer o socialismo", ensinou, vangloriando-se de suas ações na primeira etapa da obra. Às vezes, na tentativa de dar nó em pingo d"água, “O-CARA!” se desavém com as palavras. No afã de explicar o seu imitigado pragmatismo para chegar e ficar no poder, ele disse, no ano passado, que, "se Jesus Cristo viesse para cá, teria de chamar Judas para fazer coalizão". Agora, tentou ser mais refinado. "No exercício do poder", ensaiou, "sou um cidadão, como diria, multinacional, multi-ideológico, não?"
DE CERTO que ele não falava da política interna, mas dos seus deveres de presidente da República diante de outros líderes nacionais. "Um chefe de Estado não é uma pessoa, é uma instituição, não tem vontade própria?", deixou-se levar. Não é bem assim, evidentemente, mas o que importa é que essa "multi-ideologia" ditada por razões de Estado é uma precária justificativa para as alianças que o governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) celebrou no âmbito interno com quem quer que se dispusesse a negociar apoio e valesse a pena - qualquer que fosse, não a sua ideologia, mas o seu prontuário.
AMOSTRA dessa última faceta, na sua mais recente entrevista, é a sua visão do que deverá necessariamente nortear as decisões do seu sucessor em relação ao que mais interessa ao Brasil - os fundamentos da política econômica. "Ganhe quem ganhar, ninguém fará nenhum disparate", previu (ou exortou), com o cuidado de acrescentar que está seguro da vitória de sua dileta candidata, Dilma (Pinóquio) Rousseff (PT-RS). E, para explicar a sua profecia, condicionou a elevação do País na hierarquia global ao bom senso do futuro governante. "Se o Brasil mantiver nos próximos 5 anos (a rigor, deveria ter dito 4 anos) a seriedade nas políticas fiscal e monetária, nos investimentos e no controle da inflação", prognosticou, "tem tudo para se transformar numa potência respeitada no mundo”.
E NESSE pedaço, “O-CARA!”pode não fazer a coisa certa - a julgar pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), faltou "seriedade", por exemplo, na política de investimentos, como está faltando agora na política fiscal -, mas, para sorte do interesse nacional, ele aprendeu qual é a coisa certa. Em outras frentes, o caso é mais complicado, e “O-CARA!” frequentemente se entrega a exercícios de contorcionismo verbal ou se agarra ao salva-vidas das metáforas para se explicar. A boia mais robusta a que se abraçou talvez seja a "metamorfose ambulante" que tomou emprestada do finado “Maluco Beleza” Raul Seixas para dissolver as aparentes contradições de sua trajetória.
APARENTES, decerto, porque por baixo das barbas do carbonário de outrora, que proclamava que "hoje não tô bom" e era preciso "mudar tudo isso que está aí", sempre bateu um coração conciliador.
TODAS as contas que não fecham nas declarações do presidente lembram a proverbial quadratura do círculo, ao traduzir um constante esforço de racionalização das escolhas feitas pelo ex-operário que repetiu à reportagem do Jornal El País a confissão de que, em 27 anos, nunca se sentiu à vontade de macacão, mas lhe bastaram 2 meses para se acostumar ao que chamou "bonita prenda", a gravata. Com essa evocação, inadvertidamente “O-CARA!” produziu um dos mais sucintos e límpidos retratos de que se tem notícia da aspiração do povo brasileiro a uma vida melhor, no marco das oportunidades abertas pela economia de mercado, alheio à pregação socialista do Partido dos Trabalhadores (PT) dos tempos carrancudos. Também pudera: ninguém mais do que o próprio Luiz Inácio da Silva encarna o vigor da mobilidade social brasileira.
A PROPÓSITO, a última dele na mesma entrevista e na mesma clave autojustificadora, foi dizer que o advento do socialismo no País passa pela consolidação do capitalismo. "Primeiro construir o capitalismo, depois fazer o socialismo", ensinou, vangloriando-se de suas ações na primeira etapa da obra. Às vezes, na tentativa de dar nó em pingo d"água, “O-CARA!” se desavém com as palavras. No afã de explicar o seu imitigado pragmatismo para chegar e ficar no poder, ele disse, no ano passado, que, "se Jesus Cristo viesse para cá, teria de chamar Judas para fazer coalizão". Agora, tentou ser mais refinado. "No exercício do poder", ensaiou, "sou um cidadão, como diria, multinacional, multi-ideológico, não?"
DE CERTO que ele não falava da política interna, mas dos seus deveres de presidente da República diante de outros líderes nacionais. "Um chefe de Estado não é uma pessoa, é uma instituição, não tem vontade própria?", deixou-se levar. Não é bem assim, evidentemente, mas o que importa é que essa "multi-ideologia" ditada por razões de Estado é uma precária justificativa para as alianças que o governo Luiz Inácio da Silva (2003-10) celebrou no âmbito interno com quem quer que se dispusesse a negociar apoio e valesse a pena - qualquer que fosse, não a sua ideologia, mas o seu prontuário.
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