Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

domingo, maio 24, 2009

Liberalidade de mercado e liberdade de expressão

O PLENÁRIO do Supremo Tribunal Federal (STF), a instância máxima da Justiça neste grande e bobo País, está para decidir se o diploma deve ou não continuar obrigatório para o exercício profissional do Jornalismo. Não é de hoje que o tema vem sendo objeto de manipulação por parte do empresariado do setor de comunicação, que tenta a todo custo acabar com a exigência.

UMA ASSOCIAÇÃO que reune os empresários da mídia do continente americano, a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), há anos tem se posicionado contra o diploma. Os argumentos do setor não resistem a menor análise. O patronato diz que a exigência fere a liberdade de imprensa etc e tal.

OS REPRESENTANTES desta casta do setor confundem deliberadamente liberdade de empresa com liberdade de imprensa e expressão. Ninguém impede ninguém de se manifestar nos espaços midiáticos, mas a elaboração diária do material jornalístico é uma especialidade como a de um advogado, médico ou engenheiro, por exemplo. Em outras palavras: pode-se imaginar o que aconteceria se fosse decidido que qualquer um pudesse advogar nos tribunais, exercer a medicina nos hospitais e elaborar pontes e edifícios?

UM INDIVÍDUO mais açodado pode afirmar, mas a advocacia, a medicina e a engenharia exigem um preparo e formação. E o jornalismo, que informa e lida com a formação de consciências, não? Se for decidido o fim da obrigatoriedade, o empresariado da mídia terá ainda maiores condições de aviltar os salários nas redações e ainda por cima contratar quem quiser e estiver mais disposto a defender seus interesses. Se hoje a mídia comercial se tornou aparelho ideológico do capital, o fim da formação profissional dos jornalistas ajudará a consolidar essa tendência. E pode servir para iniciar uma ofensiva neoliberal que objetiva a desregulamentação de outras profissões.

DOS MUITOS argumentos utilizados contra a exigência, um em especial é de que muitas escolas de jornalismo são de péssima qualidade. Podem até ser, mas e as que formam advogados, médicos, engenheiros e outros profissionais são melhores? A péssima qualidade de um curso de direito, medicina ou engenharia deve servir de argumento para o fim da exigência do diploma das referidas profissões? Claro que não. A sociedade tem que exigir a melhoria da qualidade do ensino e impedir a proliferação das vendetas do ensino, voltados para o lucro fácil.

PORÉM, a manipulação patronal sobre a questão do diploma não se resume aos comunicados da SIP. Foi divulgado um relatório da Divisão Especial para Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA) em que consta a oposição à exigência do diploma para o exercício do jornalismo. Ao adotar esse posicionamento, a OEA argumenta, com base em informações da SIP, que a exigência constitui “uma restrição à liberdade de expressão”. Ou seja, além de forçar a barra, a OEA também confunde liberdade de imprensa com liberdade de empresa e deixou de consultar setores representativos dos jornalistas, como, por exemplo, a Federação Latino-americana de Jornalistas (Felap). Isto é, a OEA não seguiu uma norma básica do jornalismo: ouvir o outro lado. Não é à toa que a entidade vem sendo duramente criticada exatamente por se posicionar em várias questões ao lado do poder econômico. Há quem diga até que não passa de um “ministério das colônias”.

AGORA se vocês imaginam que o empresariado da mídia se contenta apenas com o apoio da SIP e da OEA, enganam-se. A TV GLOBO utilizou o seu departamento de teledramaturgia para dar o recado. Numa das telenovelas da emissora (Paraíso) aparece como personagem um jornalista veterano argumentando contra a exigência do diploma. Coincidência?

TAL TEMA, é claro, exige um aprofundamento. Não deveria ser decidido apenas pelo 11 ministros do STF, por mais ilibados que sejam considerados. Qual o conhecimento prático que tem algum deles para decidir a questão, que, sem dúvida, não é apenas jurídica. É visível a pressão sobre os ministros que vem sendo exercida pelo patronato que dispõe de amplos espaços para vender o seu peixe (podre).

O EMPRESARIADO da mídia quer o fim da exigência do diploma. Para alcançar tal “tento”, não é de hoje que se vale do seu arsenal de pressão pouco democrático. E ainda por cima escondendo o jogo, ou seja, de que almeja de todas as formas manter o seu poder de dominação e a liberdade de empresa.