Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

sábado, novembro 06, 2010

O manda-chuva

SÃO PAULO (SP) - O PRESIDENTE do Conselho de Administração da Companhia Vale do Rio Doce (Vale S/A), o economista Roger Agnelli, atribuiu a grupos do Partido dos Trabalhadores (PT) a nova onda de rumores sobre sua substituição, com a posse de Dilma Rousseff (PT-RS) na Presidência da República. É tudo parte do "jogo político", segundo Agnelli. Há muita gente, disse, empenhada em ganhar uma cadeira na diretoria da empresa. "E é geralmente gente do PT", acrescentou. Como em outras ocasiões, Agnelli, mesmo apontando interesses de setores petistas e defendendo as desestatizações esforçou-se para evitar o confronto com o vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), e com sua sucessora, Dilma Rousseff. Mas o caso não se limita à ambição de alguns correligionários do vosso guia nem a rumores passageiros.

ESSAS pressões sobre a administração da Vale, a maior empresa privada do Brasil, vêm de longe e seu principal articulador tem sido sempre “O-CARA!”. Agnelli mencionou a existência de petistas inconformados com a desestatização da economia, mas descreveu como "boa" sua relação com o partido. Sua atitude é compreensível. Mas os fatos são conhecidos. O conflito ganhou notoriedade quando a empresa, no pior momento da crise econômica internacional, em 2008, anunciou a demissão de 1.300 empregados. Na mesma época, a Embraer S/A, outra grande empresa desestazada nos anos 1990, decidiu reduzir o quadro de funcionários. Do Palácio do Planalto partiram censuras e pressões sobre as duas companhias. Foram claras tentativas de interferência na gestão de duas empresas com maioria de capital privado e ações negociadas em bolsa de valores mundo afora. Sem dar a necessária atenção a esses fatos, Luiz Inácio da Silva tentou orientar os diretores das duas companhias e cobrar-lhes explicações por seus atos. Não se trata, portanto, apenas de grupos do PT. Também o vosso guia ainda mostra dificuldade em aceitar a desestatização de grandes - e hoje muito mais eficientes - empresas brasileiras.

ALÉM de criticar as demissões, ele pressionou a presidência da Vale S/A para aumentar os investimentos no Brasil e, particularmente, para ampliar a atuação do grupo na siderurgia. Também quanto a esse ponto o executivo Agnelli tenta "pôr água na fervura", dizendo compreender o empenho do vosso presidente da República em promover a expansão da indústria do aço. Mas nenhuma quantidade de "água fria" mudará os fatos. Um presidente da República pode manifestar desejos e até convidar dirigentes de empresas para a discussão de planos, mas não tem o direito de tentar interferir em suas decisões estratégicas e de pressioná-los para que aceitem seu comando.

E COMO não conseguiu intervir tanto quanto pretendia, “O-CARA!” manobrou para substituir o presidente da Vale. Também essa manobra foi amplamente noticiada. Mas o governo não tem ações suficientes para derrubar o presidente da empresa. Somando as participações da BNDESPar (uma subsidiária do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES) e dos fundos de aposentadoria e pensão dos empregados das empresas e bancos estatais, o governo conseguiria 61,51% dos votos, mas seriam necessários 67% para a destituição de Roger Agnelli. O empresário Eike Batista (dono do Grupo X) tentou comprar uma fatia importante das ações, para facilitar a substituição do presidente do Conselho de administração da Companhia Vale S/A. Não conseguiu, mas mostrou até onde vai sua disposição de agradar a um chefe de governo.

O VOSSO guia, Luiz Inácio da Silva, não conseguiu que seu governo assumisse o comando da Vale S/A nem o comando da Embraer S/A. Seus companheiros não deixaram, no entanto, de fazer campanha pela reestatização das duas empresas. Mas o presidente da República pelo menos conseguiu assumir a chefia de fato da Petrobrás, determinando seus planos de investimento e contestando publicamente os dirigentes da empresa. Eles só decidiram investir em refinarias no Nordeste, disse “O-CARA!”, porque ele mandou. Não o teriam feito, se fossem guiados pelos critérios empresariais. Nenhum desses dirigentes mostrou desconforto por ter sido criticado. O presidente Lula e seus companheiros decerto gostariam de ter executivos com a mesma disposição em outras grandes companhias, a começar pelas empresas desestatizadas. Será uma de suas prioridades, com o lullopetismo instalado no Palácio do Planalto, no governo da presidente eleita Dilma Rousseff.