Modus operandi do retrocesso
SÃO PAULO (SP)- O GOVERNO Luiz Inácio da Silva (2003-10) desistiu de desestatizar e conceder a iniciativa privada a recuperação, preservação e administração de um trecho de 300 km da BR-381, rodovia que liga a Capital Mineira, Belo Horizonte, a cidade de Governador Valadares, no nordeste do Estado. Motivo, segundo explicou o ministro de Estado dos Transportes, Alfredo Nascimento (PRB-MT): o pedágio ficaria muito caro, já que a estrada exige investimentos pesados. A obra, agora, será feita pelo próprio governo.
PODE até parecer uma decisão sensata. Para não onerar os que utilizam a estrada, o Governo Federal assume a tarefa de prestar esse serviço público. É falso, porém.
PARA início da conversa a obra não será feita; não num horizonte de tempo razoável. Se o governo não tinha o dinheiro para mantê-la minimamente em condições, se os investimentos em outras estradas são limitados e andam atrasados, de onde vai sair o dinheiro graúdo para aquele trecho?
NA VERDADE, a alternativa, não estava entre uma boa estrada privatizada/pedagiada e uma rodovia pública razoável e de graça. Era ou estrada pedagiada ou a mesma porcaria que está lá. Por que se optou pela porcaria? Por razões políticas. Num ano eleitoral, o governo não quer aparecer como tendo privatizado uma estrada importante e na qual se pagaria pedágio considerado caro.
LÁ ATRÁS, já no segundo mandato, e depois de mais de quatro anos estudando uma fórmula de investir em estradas que não fosse o "neoliberalismo" da concessão, o governo petista resolveu conceder algumas vias, mas de tal modo que o pedágio saísse bem baratinho. Não cobrou outorga das concessionárias - ou seja, entregou de graça as estradas - e selecionou os vencedores pelo critério do menor pedágio. Teve empresa que ganhou propondo pedágio de menos de R$ 1, fato que foi alardeado pelo governo como o modo lullista de privatizar, digo, de conceder.
OCORRE, porém, que a coisa não andou muito bem. Empresas vencedoras, em algum tempo, passaram a pedir reajustes extras nos pedágios, sem o que não teriam os recursos para investir na melhoria das rodovias. Continua enrolado. Com isso, o processo de concessão de rodovias acabou suspenso, como se comprovou com esse caso da BR-381.
E REPAREM leitores: a preocupação não foi com a melhoria da infra-estrutura ou mesmo com o bolso dos usuários. Foi simplesmente para evitar uma complicação política ou a perda do discurso que compara o pedágio lullista com o pedágio peessedebista.
DE FATO construção e gestão de estradas é investimento caro. Por isso praticamente no mundo todo se opta pelos pedágios como forma de financiamento. Também se considera justo que o custo da estrada seja pago pelos seus usuários diretos, e não por todos os contribuintes. É comum que se cobre pelo uso, mesmo quando a estrada é operada pelo governo.
EXISTE ainda toda uma discussão sobre o preço do pedágio, especialmente quando a rodovia é concedida a empresas privadas. Se o governo cobra pela concessão e se exige investimentos pesados na obra, é claro que o pedágio fica mais caro. É o caso das estradas paulistas, as "tucanas" - são as melhores do País, com padrão internacional, mas caras.
E REDUZINDO-SE o padrão e sem cobrança pela outorga, sai mais barato. É uma opção. Tem a vantagem de facilitar a vida dos usuários, mas uma desvantagem importante: o governo, dono da estrada, não ganha nada com a concessão. Se cobrasse por ela, o governo poderia, por exemplo, financiar estradas não rentáveis ou gastar mais em Saúde e Educação.
PORÉM esse debate passou longe do governo. A questão ali era como obter um pedágio baratinho para usar na campanha eleitoral. Não conseguindo, opta-se pela estrada pública e ruim.
O MESMÍSSIMO enredo desenrola com o nossos aeroportos. Hoje é praticamente tudo estatal. As tarifas de embarque e operação são caras, mas os serviços estão longe de eficientes. É preciso ampliar os aeroportos existentes e construir novos, mas os investimentos atuais, públicos, do Programa de Aceleração do Crescimento Econômico (PAC), mal dão para um quebra-galho. Em resumo, trata-se de um fracasso, cada vez mais evidente na medida em que o País cresce e aumenta a demanda de passageiros e carga. Com a aproximação da Copa do Mundo de Futebol no Brasil em 2014 e dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016, a situação é simplesmente crítica.
ENTÃO, o que faz o governo? Não sabe. O ministro de Estado da Defesa, Nelson Jobim (PMDB-RS), que manda na Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero), a estatal que administra os aeroportos brasileiros, havia anunciado planos de abrir o capital da empresa, comercializar suas ações na Bolsa de Valores e assim levantar o dinheiro necessário para novos investimentos. Era uma ideia interessante, mas ficou por aí. Também parecia, num dado momento, que a desestatização - pelo sistema de concessão a empresas privadas de aeroportos atuais ou a construir -, era uma hipótese bem-vista na assessoria de Jobim. O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ), pediu esse tipo de desestatização, e urgente, para o Aeroporto Internacional Tom Jobim. Mas também não andou.
NESSE CASO houve uma curiosa mistura de doutrina de segurança militar e ideologia estatizante. Para oficiais da Aeronáutica, a aviação, sendo estratégica para a defesa, pois o País pode ser alvo de um ataque aéreo, tem de ser controlada pela Força Aérea Brasileira (FAB). Para um certo pensamento político, a aviação é estratégica para a economia local, por isso tem de estar em mãos nacionais e estatais. Ora, o fato de um aeroporto ser administrado por uma companhia privada não impede que a Aeronáutica cumpra suas funções constitucionais de segurança nacional. E, se é estratégico para a economia, não se conclui daí que tenha de ser uma empresa estatal, mas eficiente.
POR OUTRO lado, a experiência internacional mostra que há aeroportos privatizados, de diferentes maneiras, que funcionam muito bem. Mas como fazer isso num momento em que “O-CARA” está entusiasmado com a criação de empresas estatais e numa campanha eleitoral em que o investimento público via PAC é uma bandeira?
DÁ NUM absurdo. Temos um setor inteiramente estatal que é um fracasso, um obstáculo ao crescimento do País, uma ameaça à Copa do Mundo de Futebol e aos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, mas que não pode ser privatizado para não atrapalhar o quê? Mais estatização!
PODE até parecer uma decisão sensata. Para não onerar os que utilizam a estrada, o Governo Federal assume a tarefa de prestar esse serviço público. É falso, porém.
PARA início da conversa a obra não será feita; não num horizonte de tempo razoável. Se o governo não tinha o dinheiro para mantê-la minimamente em condições, se os investimentos em outras estradas são limitados e andam atrasados, de onde vai sair o dinheiro graúdo para aquele trecho?
NA VERDADE, a alternativa, não estava entre uma boa estrada privatizada/pedagiada e uma rodovia pública razoável e de graça. Era ou estrada pedagiada ou a mesma porcaria que está lá. Por que se optou pela porcaria? Por razões políticas. Num ano eleitoral, o governo não quer aparecer como tendo privatizado uma estrada importante e na qual se pagaria pedágio considerado caro.
LÁ ATRÁS, já no segundo mandato, e depois de mais de quatro anos estudando uma fórmula de investir em estradas que não fosse o "neoliberalismo" da concessão, o governo petista resolveu conceder algumas vias, mas de tal modo que o pedágio saísse bem baratinho. Não cobrou outorga das concessionárias - ou seja, entregou de graça as estradas - e selecionou os vencedores pelo critério do menor pedágio. Teve empresa que ganhou propondo pedágio de menos de R$ 1, fato que foi alardeado pelo governo como o modo lullista de privatizar, digo, de conceder.
OCORRE, porém, que a coisa não andou muito bem. Empresas vencedoras, em algum tempo, passaram a pedir reajustes extras nos pedágios, sem o que não teriam os recursos para investir na melhoria das rodovias. Continua enrolado. Com isso, o processo de concessão de rodovias acabou suspenso, como se comprovou com esse caso da BR-381.
E REPAREM leitores: a preocupação não foi com a melhoria da infra-estrutura ou mesmo com o bolso dos usuários. Foi simplesmente para evitar uma complicação política ou a perda do discurso que compara o pedágio lullista com o pedágio peessedebista.
DE FATO construção e gestão de estradas é investimento caro. Por isso praticamente no mundo todo se opta pelos pedágios como forma de financiamento. Também se considera justo que o custo da estrada seja pago pelos seus usuários diretos, e não por todos os contribuintes. É comum que se cobre pelo uso, mesmo quando a estrada é operada pelo governo.
EXISTE ainda toda uma discussão sobre o preço do pedágio, especialmente quando a rodovia é concedida a empresas privadas. Se o governo cobra pela concessão e se exige investimentos pesados na obra, é claro que o pedágio fica mais caro. É o caso das estradas paulistas, as "tucanas" - são as melhores do País, com padrão internacional, mas caras.
E REDUZINDO-SE o padrão e sem cobrança pela outorga, sai mais barato. É uma opção. Tem a vantagem de facilitar a vida dos usuários, mas uma desvantagem importante: o governo, dono da estrada, não ganha nada com a concessão. Se cobrasse por ela, o governo poderia, por exemplo, financiar estradas não rentáveis ou gastar mais em Saúde e Educação.
PORÉM esse debate passou longe do governo. A questão ali era como obter um pedágio baratinho para usar na campanha eleitoral. Não conseguindo, opta-se pela estrada pública e ruim.
O MESMÍSSIMO enredo desenrola com o nossos aeroportos. Hoje é praticamente tudo estatal. As tarifas de embarque e operação são caras, mas os serviços estão longe de eficientes. É preciso ampliar os aeroportos existentes e construir novos, mas os investimentos atuais, públicos, do Programa de Aceleração do Crescimento Econômico (PAC), mal dão para um quebra-galho. Em resumo, trata-se de um fracasso, cada vez mais evidente na medida em que o País cresce e aumenta a demanda de passageiros e carga. Com a aproximação da Copa do Mundo de Futebol no Brasil em 2014 e dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016, a situação é simplesmente crítica.
ENTÃO, o que faz o governo? Não sabe. O ministro de Estado da Defesa, Nelson Jobim (PMDB-RS), que manda na Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero), a estatal que administra os aeroportos brasileiros, havia anunciado planos de abrir o capital da empresa, comercializar suas ações na Bolsa de Valores e assim levantar o dinheiro necessário para novos investimentos. Era uma ideia interessante, mas ficou por aí. Também parecia, num dado momento, que a desestatização - pelo sistema de concessão a empresas privadas de aeroportos atuais ou a construir -, era uma hipótese bem-vista na assessoria de Jobim. O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ), pediu esse tipo de desestatização, e urgente, para o Aeroporto Internacional Tom Jobim. Mas também não andou.
NESSE CASO houve uma curiosa mistura de doutrina de segurança militar e ideologia estatizante. Para oficiais da Aeronáutica, a aviação, sendo estratégica para a defesa, pois o País pode ser alvo de um ataque aéreo, tem de ser controlada pela Força Aérea Brasileira (FAB). Para um certo pensamento político, a aviação é estratégica para a economia local, por isso tem de estar em mãos nacionais e estatais. Ora, o fato de um aeroporto ser administrado por uma companhia privada não impede que a Aeronáutica cumpra suas funções constitucionais de segurança nacional. E, se é estratégico para a economia, não se conclui daí que tenha de ser uma empresa estatal, mas eficiente.
POR OUTRO lado, a experiência internacional mostra que há aeroportos privatizados, de diferentes maneiras, que funcionam muito bem. Mas como fazer isso num momento em que “O-CARA” está entusiasmado com a criação de empresas estatais e numa campanha eleitoral em que o investimento público via PAC é uma bandeira?
DÁ NUM absurdo. Temos um setor inteiramente estatal que é um fracasso, um obstáculo ao crescimento do País, uma ameaça à Copa do Mundo de Futebol e aos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, mas que não pode ser privatizado para não atrapalhar o quê? Mais estatização!
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