A desculpa da licença semântica
PARA O vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), pelo menos, a aprovação pelo Congresso Nacional do Projeto de Lei que institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima teve uma grande utilidade política. Com base no texto aprovado no final de Novembro de 2009, “O-CARA” pôde anunciar na conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas, realizada no início do último mês de Dezembro em Copenhague, que o governo do Brasil estabeleceu a meta de reduzir entre 36,1% e 38,9% das emissões de gases poluentes até 2020. "Não é uma proposta para barganhar. É um compromisso", garantiu à plateia internacional.
PORÉM, não se pode ter uma certeza que o texto sancionado na última Terça-feira do ano (29) por aquela criatura tenha outra consequência prática além de seu uso político perante autoridades de todo o mundo, pois a lei não estabelece a obrigatoriedade do cumprimento da meta. Trata-se de uma meta voluntária, que espertamente a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) introduziu, por meio de emenda, no texto então em discussão no Senado Federal, para evitar que a senadora Marina Silva (PV-AC), ex-ministra de Estado do Meio Ambiente, e agora pré-candidata presidencial e adversária política desse governo, apresentasse emenda mais dura, que transformaria a redução de gases poluentes em compromisso legal e compulsório.
NAQUELA ocasião, o sucessor de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente, Carlos Minc (PT-RJ), teve de jogar com as palavras para tentar justificar o caráter voluntário da meta. "Se não cumprir, será uma desmoralização total e absoluta", afirmou. Pode ser. Mas o descumprimento, se ocorrer, só será constatado na prática em 2020, quando o governo Luiz Inácio da Silva - e a gestão de Minc no Ministério - já terá terminado há uma década e poucos se lembrarão do que ele prometeu. "Na minha cabeça, a palavra 'voluntário' não significa que o compromisso não seja obrigatório, diz apenas que a motivação é autônoma", disse Minc, tentando dar um salto tríplice mortal na semântica. Mas o que o ministro pensa não coincide com os dicionários. Voluntário é o que age espontaneamente, o que faz por vontade própria, sem coação. É exatamente isso que significa a expressão inserida na lei. "Inventamos uma lei cujo cumprimento é voluntário", observou à nossa reportagem o diretor de campanhas do Greenpeace no Brasil, Sérgio Leitão. "É mais uma bobagem para o velho festival de besteiras que assola o País”.
RESUMINDO: em relação à redução das emissões, a lei não garante nada e, por isso, seus efeitos práticos podem ser nulos. Há outros pontos vagos. Entre os princípios da Política Nacional sobre Mudança do Clima estão a participação cidadã, o desenvolvimento sustentável e, no plano internacional, a assunção de "responsabilidades comuns, porém diferenciadas".
TODAS AS medidas que vierem a ser tomadas no âmbito dessa política devem ser motivadas por "razoável consenso por parte dos meios científicos e técnicos" e levar em conta "os diferentes contextos socioeconômicos", distribuindo os encargos "de modo equitativo e equilibrado".
ESSA LEI, como reconheceu a secretária de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Suzana Kahn Ribeiro (PT-MA), "traça diretrizes gerais, é um plano de voo". Por isso, durante a tramitação do PL no Congresso Nacional, o governo evitou a inserção no texto de definições mais precisas.
DORAVANTE, o governo vai concentrar forças na regulamentação. "Nossa preocupação é como fazer que tais compromissos sejam materializados", me disse Kahn Ribeiro. Mas o fato é que a regulamentação não pode fazer mais do que a lei - e a lei pode muito pouco. Há uma certa pressa no Ministério em concluir a regulamentação. O objetivo é que tudo esteja pronto até Março - quando, não por coincidência, os ministros de Estado que pretenderem disputar as eleições deverão deixar o cargo.
TODOS OS vetos do vosso presidente da República ao texto aprovado pelo Congresso Nacional - entre os quais um motivado por uma questão técnica de natureza jurídica e outro que se destinou a retirar o que o governo considerou limitação excessiva ao uso de combustíveis fósseis na geração de energia - conservaram o caráter meramente indicativo dos principais dispositivos da lei. Por isso, se serviu para dar lustro ao discurso do “CARA” em Copenhague, a lei não bastará para sustentar a posição brasileira na conferência marcada para a Cidade do México em 2010. O Brasil, como observou o diretor do Greenpeace, terá de mostrar mais do que boas intenções.
PORÉM, não se pode ter uma certeza que o texto sancionado na última Terça-feira do ano (29) por aquela criatura tenha outra consequência prática além de seu uso político perante autoridades de todo o mundo, pois a lei não estabelece a obrigatoriedade do cumprimento da meta. Trata-se de uma meta voluntária, que espertamente a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) introduziu, por meio de emenda, no texto então em discussão no Senado Federal, para evitar que a senadora Marina Silva (PV-AC), ex-ministra de Estado do Meio Ambiente, e agora pré-candidata presidencial e adversária política desse governo, apresentasse emenda mais dura, que transformaria a redução de gases poluentes em compromisso legal e compulsório.
NAQUELA ocasião, o sucessor de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente, Carlos Minc (PT-RJ), teve de jogar com as palavras para tentar justificar o caráter voluntário da meta. "Se não cumprir, será uma desmoralização total e absoluta", afirmou. Pode ser. Mas o descumprimento, se ocorrer, só será constatado na prática em 2020, quando o governo Luiz Inácio da Silva - e a gestão de Minc no Ministério - já terá terminado há uma década e poucos se lembrarão do que ele prometeu. "Na minha cabeça, a palavra 'voluntário' não significa que o compromisso não seja obrigatório, diz apenas que a motivação é autônoma", disse Minc, tentando dar um salto tríplice mortal na semântica. Mas o que o ministro pensa não coincide com os dicionários. Voluntário é o que age espontaneamente, o que faz por vontade própria, sem coação. É exatamente isso que significa a expressão inserida na lei. "Inventamos uma lei cujo cumprimento é voluntário", observou à nossa reportagem o diretor de campanhas do Greenpeace no Brasil, Sérgio Leitão. "É mais uma bobagem para o velho festival de besteiras que assola o País”.
RESUMINDO: em relação à redução das emissões, a lei não garante nada e, por isso, seus efeitos práticos podem ser nulos. Há outros pontos vagos. Entre os princípios da Política Nacional sobre Mudança do Clima estão a participação cidadã, o desenvolvimento sustentável e, no plano internacional, a assunção de "responsabilidades comuns, porém diferenciadas".
TODAS AS medidas que vierem a ser tomadas no âmbito dessa política devem ser motivadas por "razoável consenso por parte dos meios científicos e técnicos" e levar em conta "os diferentes contextos socioeconômicos", distribuindo os encargos "de modo equitativo e equilibrado".
ESSA LEI, como reconheceu a secretária de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Suzana Kahn Ribeiro (PT-MA), "traça diretrizes gerais, é um plano de voo". Por isso, durante a tramitação do PL no Congresso Nacional, o governo evitou a inserção no texto de definições mais precisas.
DORAVANTE, o governo vai concentrar forças na regulamentação. "Nossa preocupação é como fazer que tais compromissos sejam materializados", me disse Kahn Ribeiro. Mas o fato é que a regulamentação não pode fazer mais do que a lei - e a lei pode muito pouco. Há uma certa pressa no Ministério em concluir a regulamentação. O objetivo é que tudo esteja pronto até Março - quando, não por coincidência, os ministros de Estado que pretenderem disputar as eleições deverão deixar o cargo.
TODOS OS vetos do vosso presidente da República ao texto aprovado pelo Congresso Nacional - entre os quais um motivado por uma questão técnica de natureza jurídica e outro que se destinou a retirar o que o governo considerou limitação excessiva ao uso de combustíveis fósseis na geração de energia - conservaram o caráter meramente indicativo dos principais dispositivos da lei. Por isso, se serviu para dar lustro ao discurso do “CARA” em Copenhague, a lei não bastará para sustentar a posição brasileira na conferência marcada para a Cidade do México em 2010. O Brasil, como observou o diretor do Greenpeace, terá de mostrar mais do que boas intenções.
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