Repúblicas caricatas
RAUL SOARES (MG) - PARTIR do momento em que as autoridades hondurenhas declararam "irreversível" e "não negociável" a destituição do presidente Manuel Zelaya, criaram-se as condições para transformar em drama político o que pudesse haver de comédia ao estilo das caricatas repúblicas bananeiras, no espetáculo anacrônico de sua remoção, de pijama, do palácio presidencial de Tegucigalpa e imediata deportação, ao amanhecer de um domingo. Ele foi derrubado depois que a Corte Suprema, apoiada pelo Congresso Nacional e o Ministério Público hondurenhos, declarou ilegal a realização de uma consulta popular, marcada para aquele 28 de Junho último. A "pesquisa", como foi denominada, abriria caminho, via plebiscito e reforma constitucional, para a reeleição de Zelaya, conforme o figurino bolivariano do caudilho Hugo Chávez, a quem esse rancheiro eleito por um partido de centro-direita se ligou no ano passado em troca de petróleo venezuelano subsidiado.
A CONSTITUIÇÃO Federal de Honduras considera cláusula pétrea o mandato único de seus presidentes - uma saudável medida preventiva contra as aventuras continuístas e quarteladas que marcaram, até o início dos anos 1980, a história daquele paupérrimo país. Se a Carta previsse também o impeachment daqueles que tentassem transgredi-la, a crise criada por Zelaya escoaria pelos devidos canais institucionais. Em vez disso, os juízes, políticos e generais hondurenhos, espantosamente cegos às mudanças do mundo ao redor, construíram uma pirâmide de desatinos, mesmo depois que a Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou inequivocamente o golpe - classificado pelo presidente Barack Obama da República Norte-americana como "terrível precedente" - e deu 72 horas para que Honduras restituísse o governo a Zelaya, sob pena de sua suspensão do organismo, com base na Carta Democrática Interamericana de 2001.
APROVADA por unanimidade, a decisão se consumou anteontem, incluindo uma recomendação, sugerida pelo Brasil, para que os países-membros revejam as relações bilaterais com o regime de Tegucigalpa, o que praticamente transforma Honduras em Estado-pária. O Governo dos Estados Unidos da América (EUA) já havia suspendido a cooperação militar com aquele país e parte da ajuda financeira que lhe destinavam. Na mesma linha, as diretorias do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Mundial (Bird) congelaram mais de US$ 200 milhões em empréstimos programados. Naturalmente, o presidente da República Bolivariana da Venezuela, General Hugo Chávez, cortou o envio de petróleo, deixando Honduras com estoques limitados a seis dias de consumo, segundo estimativas. Se os dirigentes hondurenhos calcularam que poderiam resistir ao isolamento político internacional até as eleições de 29 de Novembro, a serem disputadas por dois candidatos do mesmo "centrão" partidário nacional de que Zelaya fazia parte, decerto não contaram com as sanções econômicas.
MAS o problema é o beco em que se colocaram, dado o curso inexorável que os fatos parecem tomar numa América resolvida a manter sepultada a tradição dos pronunciamentos militares e com um presidente norte-americano que se comprometeu a virar a página do intervencionismo na região. Há duas semanas, queimaram a oportunidade de uma saída negociada quando se recusaram a autorizar o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, a intermediar uma solução pela qual Zelaya, uma vez persuadido a acatar a sentença judicial contra a consulta popular, seria reconduzido ao poder, com o restabelecimento das liberdades públicas e eventual antecipação das eleições. O que a sua inflexibilidade conseguiu foi colocar Zelaya sob as asas de Chávez, obviamente empenhado em agravar a crise para tirar dela o máximo proveito no cenário latino-americano.
NOS primeiros dias, a condenação do Governo dos EUA ao golpe não permitiu que Chávez desfilasse como campeão da causa democrática. Depois, o endurecimento hondurenho facilitou as coisas para ele. Induziu Zelaya a ignorar os apelos para que não tentasse voltar no domingo a Tegucigalpa, onde o avião venezuelano em que viajava foi impedido de pousar, enquanto um confronto perto do aeroporto fazia as primeiras vítimas fatais do golpe. Em seguida, à maneira do seu façanhudo mentor, Zelaya diria que "se tivesse um paraquedas, imediatamente me lançaria desse avião". O presidente de facto de Honduras, Roberto Micheletti, fez a sua parte acusando a Nicarágua bolivariana de Daniel Ortega de iniciar uma "invasão psicológica" do país.
A CONSTITUIÇÃO Federal de Honduras considera cláusula pétrea o mandato único de seus presidentes - uma saudável medida preventiva contra as aventuras continuístas e quarteladas que marcaram, até o início dos anos 1980, a história daquele paupérrimo país. Se a Carta previsse também o impeachment daqueles que tentassem transgredi-la, a crise criada por Zelaya escoaria pelos devidos canais institucionais. Em vez disso, os juízes, políticos e generais hondurenhos, espantosamente cegos às mudanças do mundo ao redor, construíram uma pirâmide de desatinos, mesmo depois que a Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou inequivocamente o golpe - classificado pelo presidente Barack Obama da República Norte-americana como "terrível precedente" - e deu 72 horas para que Honduras restituísse o governo a Zelaya, sob pena de sua suspensão do organismo, com base na Carta Democrática Interamericana de 2001.
APROVADA por unanimidade, a decisão se consumou anteontem, incluindo uma recomendação, sugerida pelo Brasil, para que os países-membros revejam as relações bilaterais com o regime de Tegucigalpa, o que praticamente transforma Honduras em Estado-pária. O Governo dos Estados Unidos da América (EUA) já havia suspendido a cooperação militar com aquele país e parte da ajuda financeira que lhe destinavam. Na mesma linha, as diretorias do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Mundial (Bird) congelaram mais de US$ 200 milhões em empréstimos programados. Naturalmente, o presidente da República Bolivariana da Venezuela, General Hugo Chávez, cortou o envio de petróleo, deixando Honduras com estoques limitados a seis dias de consumo, segundo estimativas. Se os dirigentes hondurenhos calcularam que poderiam resistir ao isolamento político internacional até as eleições de 29 de Novembro, a serem disputadas por dois candidatos do mesmo "centrão" partidário nacional de que Zelaya fazia parte, decerto não contaram com as sanções econômicas.
MAS o problema é o beco em que se colocaram, dado o curso inexorável que os fatos parecem tomar numa América resolvida a manter sepultada a tradição dos pronunciamentos militares e com um presidente norte-americano que se comprometeu a virar a página do intervencionismo na região. Há duas semanas, queimaram a oportunidade de uma saída negociada quando se recusaram a autorizar o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, a intermediar uma solução pela qual Zelaya, uma vez persuadido a acatar a sentença judicial contra a consulta popular, seria reconduzido ao poder, com o restabelecimento das liberdades públicas e eventual antecipação das eleições. O que a sua inflexibilidade conseguiu foi colocar Zelaya sob as asas de Chávez, obviamente empenhado em agravar a crise para tirar dela o máximo proveito no cenário latino-americano.
NOS primeiros dias, a condenação do Governo dos EUA ao golpe não permitiu que Chávez desfilasse como campeão da causa democrática. Depois, o endurecimento hondurenho facilitou as coisas para ele. Induziu Zelaya a ignorar os apelos para que não tentasse voltar no domingo a Tegucigalpa, onde o avião venezuelano em que viajava foi impedido de pousar, enquanto um confronto perto do aeroporto fazia as primeiras vítimas fatais do golpe. Em seguida, à maneira do seu façanhudo mentor, Zelaya diria que "se tivesse um paraquedas, imediatamente me lançaria desse avião". O presidente de facto de Honduras, Roberto Micheletti, fez a sua parte acusando a Nicarágua bolivariana de Daniel Ortega de iniciar uma "invasão psicológica" do país.
<< Página inicial