Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

terça-feira, julho 07, 2009

Esqueletos dos primos ricos

MAIS UM alerta contra a crescente dívida pública norte-americana, hoje próxima de US$ 11,4 trilhões, cerca de 80% do Produto Interno Bruto (PIB), foi lançado pelo presidente do Federal Reserve (Fed), Ben Bernanke. Quanto maior o débito, maior o pagamento de juros e maior o déficit, advertiu o presidente do Fed. Isso levará, afirmou, a uma situação insustentável. Este adjetivo foi usado há pouco tempo pelo presidente da República dos Estados Unidos da América (EUA), Barack Obama, ao propor um programa de ajuste das contas públicas para os próximos anos. Essa não é uma questão de interesse interno, mas um tema relevante para todo o mundo. Se o governo norte-americano tiver de pagar juros mais altos para rolar seus títulos, outros países, incluído o Brasil, serão afetados, porque o dinheiro ficará mais caro no mercado internacional.

A DÍVIDA pública federal norte-americana tem aumentado à razão de US$ 3,8 bilhões por dia desde o fim de Setembro de 2007. Isso é uma consequência do aumento do déficit público. O rombo nas contas federais, US$ 459 bilhões no ano fiscal de 2008, está estimado em US$ 1,75 trilhão neste exercício e deverá, segundo os planos do governo, diminuir para US$ 1,1 trilhão em 2010. Mas isso dependerá de freio no gasto público e, neste momento, a prioridade oficial é repor a economia em movimento. A grande expansão do déficit neste ano resulta principalmente das medidas anticrise adotadas a partir do terceiro trimestre de 2008, incluído o socorro ao setor automobilístico.

TAMBÉM NA Europa os governos vêm gastando muito para atenuar a recessão e limitar os efeitos da crise em alguns setores produtivos e no sistema financeiro. Também a política monetária tem sido afrouxada. Outro dia, o Banco Central Europeu (BCE) decidiu manter os juros básicos em 1%, os menores desde sua criação.

O BANCO da Inglaterra também realizou a revisão periódica dos juros e conservou a taxa de 0,5% pelo quarto mês consecutivo. Com juros muito baixos e pouco espaço para continuar reduzindo o custo do dinheiro, os dois bancos centrais, assim como o americano, mantêm um programa de compra de títulos em circulação para injetar moeda no mercado.

APESAR dessa política monetária expansiva e do aumento do gasto público, a atividade econômica permanece retraída nos EUA e na Europa. Alguns sinais positivos têm aparecido, mas insuficientes para permitir previsões mais otimistas para este ano. Nos EUA, os pedidos de auxílio-desemprego diminuíram levemente no final de Maio, mas o número de beneficiários continua acima de 6,7 milhões.

O FED continua estimando alguma reanimação da economia a partir do fim do ano. Na zona do euro, as vendas do comércio varejista foram 0,2% maiores em abril do que em março. Foi o primeiro aumento mensal desde Setembro.

MAS A nova projeção do BCE para 2009 é muito pior que a de Março. Há três meses, calculava-se para este ano uma contração do produto entre 2,2% e 3,2%. Pela nova estimativa, a redução ficará entre 4,1% e 5,1%. Para 2010, a previsão fica entre uma contração de 0,7% e uma expansão de 1%.

O PANORAMA europeu continua menos animador que o norte-americano e as piores perspectivas ainda são as da Europa do Leste. Vários países dessa área recorreram ao amargo auxílio do Fundo Monetário Internacional (FMI) para enfrentar a crise e sua recuperação deverá ser lenta.

EMBORA a prioridade ainda seja o combate à recessão, também o presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, está preocupado com a deterioração das contas públicas. O desequilíbrio fiscal na zona do euro poderá atrapalhar a recuperação, se minar a confiança dos empresários e das famílias, disse Trichet na quinta-feira. Seu comentário foi uma reação a declarações da ministra das Finanças da França, Christine Lagarde, favorável a um afrouxamento dos critérios de estabilidade financeira para os países da zona do euro, fixados pelo Tratado de Maastricht.

BERNANKE e Trichet estão certos. Embora a reativação da economia seja a tarefa mais urgente, é preciso pensar desde logo em políticas de estabilização fiscal para os próximos anos. Se isso não for feito, as pressões inflacionárias serão inevitáveis, a gestão da dívida pública será mais custosa e será mais difícil manter um crescimento econômico prolongado. Essa questão é de interesse fundamental também para os países em desenvolvimento.