Notas do Pinheiro

Jornalismo Analítico

quarta-feira, dezembro 23, 2009

Projeto sectário do lullismo

A UNIÃO Federal poderá aumentar sua folha de salários até o limite de 2,5% acima da inflação, anualmente, até 2019, se for convertido em legislação o Projeto de Lei (PL) 611/07, aprovado na Quarta-feira da semana passada, 16, pelo plenário do Senado Federal. Na próxima etapa, o assunto será examinado na Câmara dos Deputados. O objetivo da proposta, segundo o senador Romero Jucá (PMDB-RR), um de seus autores, é a criação de um limite para o aumento do gasto com pessoal. Com essa restrição, haverá mais espaço nas contas públicas para o investimento, argumenta o senador. Se a lei já estivesse em vigor, a folha federal poderia ter crescido cerca de 7% neste ano, em valores nominais. Na proposta orçamentária para 2009, apresentada no segundo semestre do ano passado, foi previsto um aumento de 11,7%. À primeira vista, a mudança permitirá maior controle das finanças da União Federal e facilitará o uso mais produtivo do dinheiro público. Mas essa conclusão é discutível. A ideia de um teto é ilusória. Na melhor das hipóteses, a despesa com o funcionalismo público dos Três Poderes da República crescerá regularmente 2,5% ao ano, acima da inflação, independentemente da situação da economia e das finanças públicas. Virar piso é o destino inexorável dos tetos salariais fixados pelo governo.

ESSA expansão do gasto com pessoal tem ficado bem acima do limite fixado no projeto. A partir de 2006, a folha salarial do Executivo sempre aumentou mais de 12% em valores correntes. A folha salarial do Legislativo variou bem menos a partir de 2007, mas no ano anterior havia crescido 24%. A folha salarial do Judiciário tem crescido em ritmo bem variado, mas nunca desprezível: 35,7% em 2006, 8,7% em 2007, 17% em 2008 e 17,9%, segundo se estima, em 2009. Na mesma Quarta-feira, 16, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, enviou ao Congresso Nacional projeto de aumento de 56,4% para o pessoal do Judiciário.

CASO esses dados forem tomados como referência, o projeto defendido pelo senador Romero Jucá representará um progresso. A lei, segundo argumento corrente no Senado Federal, servirá para conter as pressões do funcionalismo. Mas essas pressões são apenas uma parte da história. O vosso presidente da República, Luiz Inácio da Silva (PT-SP), tem sido habitualmente generoso nos aumentos salariais ao funcionalismo. Essa generosidade não tem relação com reformas efetivas na administração federal nem é sintoma de um governo acuado pelos sindicatos do setor público. A orientação seguida pelo “CARA” explica-se mais facilmente como parte de um projeto partidário. Isso é perfeitamente compreensível, quando se leva em conta a filiação sindical dos grupos mais organizados do funcionalismo.
SOMENTE e tão somente entre a equipe econômica do governo houve alguma resistência a essa generosidade. O Ministério da Fazenda teve algum êxito na defesa dessa posição. De lá partiu, em 2007, a primeira proposta de limite para a expansão da folha. Na primeira versão, apresentada pelo Executivo, o teto do aumento real era 1,5%. O senador Romero Jucá elevou-o para 2,5%.

CASO o projeto se torne lei, o limite só será aplicado quando os efeitos das bondades já concedidas estiverem absorvidos pelo Orçamento Geral da União (OGU). Essas bondades ainda acrescentarão muita gordura à folha de salários. A partir daí, o governo, para cumprir a lei, terá de encontrar um equilíbrio entre a ampliação do quadro e a concessão de aumentos.

PORÉM não haverá nenhum grande aperto. A cada ano o aumento real de 2,5% será acrescentado à base de cálculo, abrindo espaço para a contração de funcionários e para nova elevação de vencimentos. Como o quadro já foi ampliado consideravelmente nos últimos sete anos, o governo poderá reservar a maior parte da expansão da folha para o aumento salarial. Os funcionários públicos federais continuarão privilegiados por um generoso aumento real. No primeiro semestre deste ano, só 11,7% dos acordos salariais proporcionaram aumentos com mais de 2% de ganho real, segundo o Departamento Intersindical de Estudos Estatísticos Sociais e do Emprego (Dieese).

OS DEMAIS trabalhadores brasileiros, do setor privado, não têm estabilidade no emprego nem garantia de ganho real. Mas pagam impostos muito pesados para sustentar a administração pública ineficaz e ineficiente. Se o governo administrasse suas contas com rigor, não precisaria fixar em lei uma expansão real de 2,5% da folha de salários. À falta de uma política séria, o contribuinte continuará pagando mais do que o razoável e recebendo muito menos do que merece em troca de seu dinheiro.